“A ilha tem seus tesouros
E viva a Gamboa meu povo”
E viva a Gamboa meu povo
Em breve volto de novo…

Partindo do nosso primeiro destino, Lençóis (Chapada Diamantina-BA), a Caravana das Alembranças fez seu segundo e aguardado pouso na Ilha de Itaparica. Por lá, fomos acolhidas pelos nossos anfitrões Mestre Jaime de Mar Grande, da Associação Cultural de Capuêra Angola Paraguassú, e Mestra Nenete, do Terno das Rosas da Gamboa. Foram 30 dias de paragem por lá, um ciclo lunar inteiro de partilhas e aprendizagens regadas à capoeira, samba de roda, encontros e reencontros com camarás de todo o Brasil.

No bairro da Gamboa, onde moram Mestre Jaime e Mestra Nenete, apresentamos “A fabulosa história da onça alembrada” no dia 5 de janeiro, um dia antes das celebrações de Santos Reis. Ocupamos a Praça da Rua do Araçá, de frente à Escola Olga Seabra, mobilizando crianças, mais velhos e pessoas de várias idades. A apresentação contou com apoio local da Lanchonete do Jutaí, montagem parceira do irmão Cled Pereira e fotografias de André Putico.

Antes de ancorar na Ilha de Itaparica (BA), fizemos uma breve passagem por Salvador, onde fomos acolhidas pela professora doutora Izabel Dantas e reencontramos Mestra Janja, do Grupo Nzinga de Capoeira Angola. Nosso reencontro com Janja foi uma vadiação das boas junto à criançada do Alto da Sereia, comunidade que acolhe a sede do grupo em Salvador, no bairro Rio Vermelho. Uma roda festiva de retorno do grupo, após as pausas provocadas pela pandemia, com a presença de Mestra Janja, Mestre Poloca, alunos e alunas de diferentes gerações.

Apresentação na Praça da Gamboa


A ILHA

A Ilha de Itaparica (BA) é a maior ilha marítima do Brasil e da Baía de Todos os Santos. Território originário de tupinambás, marcado pelas primeiras invasões europeias nesse chão que hoje chamamos Brasil. Colonizada por jesuítas em 1560 e palco de lutas pela independência da Bahia entre 1821 e 1823. Localizada há 13 km de Salvador, Itaparica é terreiro de terreiros, de sambas de roda e de capoeiragens que giram mundo. Paraíso de mata atlântica, vida simples, mar azul, manguezais, recife de corais. Museu aberto de ruínas históricas, raízes expostas e bica de aǵua pura que sacia a sede de toda gente.


MESTRA NENETE E O TERNO DAS ROSAS DA GAMBOA

A Ilha de Itaparica nos apresentou Mestra Nenete e toda a sua doçura manifestada em cantos que embalam sambas de roda, corridos de capoeira, valsas e marchas de folias de reis. Dona Nenete (Nilzete Lima dos Santos) é nascida na Gamboa, Ilha de Itaparica, em 15 de julho de 1944. Filha de Seu Manoel Lima, músico autodidata e carpinteiro, e Dona Francisca Lima, marisqueira e costureira de mão cheia, profissão herdada por ela. É também irmã de Mestre Jaime de Mar Grande. De fala doce e coração acolhedor, Mestra Nenete é uma das coordenadoras do Terno das Rosas da Gamboa, junto com suas irmãs Tunga e Dida, e uma das grandes referências culturais da Ilha.

“O Terno das Rosas da Gamboa é uma forma de expressão popular formada por mulheres, que celebra Santos Reis e louva o menino Jesus durante o mês de janeiro. Vestidas com roupa rosa e flores nos cabelos, elas saem em caminhada às ruas da comunidade, segurando lanternas e cantando músicas de louvação, acompanhadas da cadência de um bom banjo, violão e pandeiros” (@ternodasrosasdagamboa). Uma caminhada mítica de mulheres celebrando e louvando a chegada do Menino Jesus, o Deus Criança, repleta de sentidos e significados culturais, políticos e culturais.

Neste ano de 2022, o terno não saiu às ruas, em respeito ao cuidado coletivo com a pandemia que ainda continua, mas brincou na sede da Associação Cultural de Capuêira Angola Paraguassú.

Salve Dona Nenete!
Salve o Terno das Rosas!

Terno das Rosas da Gamboa, no dia de Santos Reis


MESTRE JAIME, PARAGUASSÚ E AS CAPOEIRAGENS DA ILHA

“Ê, Angola
Angola força divina
Menina quer matar sede
Vem beber água da mina…”

A Ilha de Itaparica (BA) é raiz de capoeiragens referência para nós, brincantes desse jogo mandingado. No tempo em que ficamos por lá, não conseguimos visitar todos os mestres e mestras residentes, mas bebemos muita água da fonte que segue nutrindo os caminhos seguintes.

Em nossa estadia no bairro da Gamboa (Vera Cruz), jogamos, proseamos e, principalmente, convivemos com Mestre Jaime de Mar Grande e sua filosofia de vida, de capoeira e de alma. Atravessados pela gripe que pegou geral no país, fomos também cuidadas por seus saberes integrativos e populares em saúde.

Na sede da Associação Cultural de Capuêra Angola Paraguassú, participamos de rodas que mataram a nossa sede de vadiar, depois de dois anos pandêmicos de isolamento. Participamos do evento de aniversário da associação, o “De vento em popa”, que neste ano aconteceu miudinho, sem divulgação, reunindo alguns alunos e quem por lá chegou na força espontânea dos encontros.

Lu, Nara e Key (caravaneiras das Alembranças) com Mestre Jaime de Mar Grande

 

Vacinades e de máscaras, vadiamos e aprendemos com a sapiência de Mestre Jaime e de seus nobres convidados: Mestre Jorge Satélite, da Gamboa; Mestre Roxinho, também da Ilha; Mestre Augusto Januário, do Reconcâvo; Mestra Samme, de São Luís (MA); Mestre Jurandir, de Salvador; e Mestre Sorriso, de Canoas (RS). Também conhecemos manas e manos capoeiras de Minas, Sampa, Rio de Janeiro e Pernambuco.

Ainda nas conexões do “De vento em popa”, visitamos a sede do Instituto Bantu, coordenado pelo Mestre Roxinho, onde participamos de uma rica roda de aprendizados. O instituto se propõe a atuar para além da capoeira, confluindo projetos sociais e culturais com a comunidade.

Dias antes, visitamos Mestre Guaxini para treinar com os camaradas do Bando Maré de Março. O treino foi na sede do grupo, em Barra Grande, que está sendo expandida com um hostel cultural que acolherá capoeiras do Brasil e do mundo.


MESTRA SAMME (MA)

Nos últimos dias da temporada Caravana das Alembranças na Ilha de Itaparica (BA), tivemos a alegria de encontrar Mestra Samme e suas infindas histórias e sabedorias de mulher capoeira, que muita trilha abriu pra gente aqui estar.

Mestra Samme – conexões BA e MA

 

Mestra Samme é do Maranhão, com anos de gingas no Capoeira Angola Laborarte e nas voltas que o mundo dá por esse Brasil. São 30 anos de capoeiragem, que hoje ela também compartilha no Centro Matroá e no coletivo Angoleiras de Upaon-Açú. Vivenciamos com a mestra duas rodas do evento “De vento em popa”, realizado pela Paraguassú, e outros memoráveis momentos de partilhas regadas a samba de roda e reflexões profundas sobre ser mulher na capoeira e na vida. Um encontro para selar os laços da nossa futura temporada no Maranhão, em junho.

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